Segundo os historiadores, a história do casamento remonta à Roma antiga, quando teria surgido a cerimônia religiosa com a presença da noiva, vestida especialmente para a ocasião, com destaque para as flores brancas e espinhos presos ao cabelo.
As flores representariam a felicidade e a vida longa e os espinhos afastariam os maus espíritos. Mais tarde foi acrescentado o véu, em referência à deusa greco-romana Vesta, protetora do lar, simbolizando a honestidade e a virgindade, virtudes imprescindíveis para uma boa prole e a continuação do “sangue”, segundo os costumes da época.
Foram os romanos também a criar um “direito do casamento”, instituindo a monogamia. Na idade média as mulheres perderam o direito de escolher seus maridos e isso ficou sendo uma decisão das famílias, que reservavam as meninas desde muito cedo para determinado parceiro.
O noivado ganhou muita importância, com a troca de alianças entre as famílias comprometidas mutuamente – e financeiramente – através do compromisso dos noivos. Nesta época o vermelho virou a cor preferida, simbolizando o sangue novo da nova família. Surgiram as celebrações suntuosas, tendo a rainha Vitória, na Inglaterra, usado o primeiro vestido de noiva tal como conhecemos hoje em dia. Ela também teria inaugurado o “casamento por amor”, o sentimento básico que deveria unir um homem e uma mulher.
A história do casamento é a história da reprodução da vida, sendo que a ele estiveram associados ritos e significados que expressavam esta preocupação: a pureza e a fidelidade, a família e a reprodução, a bênção e as oferendas, a descendência e a virgindade, o amor e o companheirismo. Alguns ritos religiosos mantém ainda hoje esta forte simbologia do casamento em relação à preservação da vida, principalmente entre as culturas indígenas.
A festa do casamento entre os camponeses brasileiros era também revestida deste sentido, muito ligado à vida da terra e das sementes: envolvia toda a comunidade que se empenhava nos preparativos, na arrumação da casa para os noivos, plantio de sementes para que o novo casal já começasse com uma boa horta ou até uma pequena lavoura, além de casais de animais e galináceos.
Muitos parentes viajavam longos dias e traziam sementes, ovos, raízes e animais como presente ao novo casal e também para trocar com os outros convidados. Era uma grande festa de troca de sementes de animais e vegetais, durando vários dias.
Festa das sementes dos noivos que se encontram para reproduzir a vida. Festa da seleção dos melhores grãos, trazidos com orgulho para a troca ou a oferenda aos noivos, resultado das colheitas nas terras longínquas. Festa também do aperfeiçoamento genético dos animais, os melhores deles escolhidos como donativo.
O casamento é o ritual das sementes. Por isso, é o ritual do amor. Semente é amor. Amor que não é propriedade, mas partilha; que implica cuidado, respeito, dedicação; que necessita experiência, contato, conhecimento. Fruto do amor, a semente possui um valor sagrado e como tal, não pode ser apropriada ou mercantilizada.
A semente é resultado das relações de amor entre os agricultores e agricultoras com a terra e um patrimônio deixado pelos antepassados para as gerações futuras. Trata-se de um casamento indissolúvel, mediado pela sacralidade, ligado à garantia da identidade e da autonomia de nossos povos em seu processo evolutivo, garantindo a manutenção da biodiversidade animal e vegetal, resultado do meio ambiente onde nascem, crescem e frutificam as sementes.
Se o casamento antigo era a festa da disseminação das sementes, da renovação dos acervos comunitários e da garantia da biodiversidade, festa da obtenção, da guarda e da reprodução da vida, ele confirma para hoje a necessidade de potencializar o intercâmbio das sementes e das informações de cultivo, como forma de garantir que as multinacionais de engenharia genética não se apropriem deste patrimônio da humanidade, acumulado em mais de 12 mil anos de história.
Deturpando valores e conspurcando a vida desde suas entranhas, a moderna tecnologia abre mão dos princípios éticos em função do lucro e do mercado, colocando a vida em perigo. Congênitas, híbridas, sintéticas ou transgênicas, as sementes vêm sendo apropriadas por empresas apátridas nada preocupadas com as conseqüências sociais, ambientais ou culturais de suas “descobertas”.
Cabe aos agricultores e agricultoras e aos movimentos sociais continuar festejando o casamento das sementes e garantindo a aquisição, acervo e reprodução da vida.